Em plena pandemia do novo coronavírus (Covid-19), o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) decidiu revisar aposentadorias e pensões de 1,7 milhão de beneficiários, pedindo documentos que comprovem que eles têm direito ao pagamento, décadas depois do benefício ter sido concedido. Em alguns casos, os aposentados estão tendo de procurar documentação de mais de 50 anos atrás.
“É um caos. Muita gente não tem mais essa documentação e isso está sendo feito um momento completamente errado, durante uma pandemia. A maioria dessas pessoas é parte de grupos de risco”, critica a presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Adriana Bramante.
“Uma idosa de 85 anos, que já recebe o benefício há 52 anos vai ter de mostrar documentos que ela nem sabe se existe. Uma outra idosa aposentada, que já recebe o benefício há quase 60 anos, tem que mostrar uma carteira profissional do marido falecido e não sabe onde procurar. E tem só 60 dias para fazer isso”, relata Adriana.
A chamada operação pente-fino do INSS, que teve início no dia 3 de setembro, começou a ser feita após uma análise administrativa, justifica a direção do Instituto. “Foi verificada a necessidade de reavaliação de documentos que embasaram a concessão dos benefícios”, dizem os técnicos.
A medida atinge todos os tipos de benefícios e os comunicados estão sendo feitos por meio de cartas. Após o recebimento da carta, o beneficiário tem 60 dias para enviar os documentos pelo site Meu Inss, ou levar pessoalmente nas agências físicas, depois de agendar dia e hora, mesmo sendo pessoas de grupos de risco, que ficarão expostas à contaminação pelo novo coronavírus.
A presidente do IBDF explica que o pente-fino nos benefícios, para apurar irregularidades, tem como base o artigo 69 da lei 8.212/1991, mas o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL), com a Medida Provisória (MP) 871/2019, que depois de sancionada junho do ano passado, se transformou na Lei 13.846/2019, deu ênfase nas revisões.
Adriana Bramante explica, no entanto, que se aposentados ou pensionistas já recebem o benefício há mais de dez anos, não podem entrar no pente-fino, a não ser que o INSS mostre que há um indício de fraude.
“Se não for assim, o INSS não pode pedir documentação com pena de corte do benefício, mas isso tem acontecido muito”, ela diz.
Por isso, a orientação do IBDF é de que, em casos de não haver justificativas por parte do INSS para exigir apresentação de documentos, deve-se procurar orientação de advogados.
O procedimento, on-line, pelo Meu INSS deve dificultar ainda mais a vida de idosos que não têm acesso as tecnologias e à internet. Antes de enviar a documentação é preciso estar cadastrado no site.
Após acessar o sistema, será necessário entrar em “Atualização de Dados de Benefício”, anexando a cópia digitalizada dos seguintes documentos:
Caso haja procurador ou representante legal do beneficiário, os documentos também deverão ser enviados
O INSS orienta aos aposentados que não conseguirem enviar a documentação a procurar uma agência do INSS, agendando antes pelo telefone 135, escolhendo a opção ‘Entrega de Documentos por Convocação’.
O INSS destaca em seu portal que “o segurado notificado que não apresentar a documentação pelo Meu INSS ou não realizar o agendamento para entrega dos documentos no prazo de 60 dias, poderá ter o benefício suspenso. E, após 30 dias da suspensão, se o beneficiário não fizer os procedimentos anteriormente citados, terá o benefício bloqueado”.
O pente-fino do INSS tem deixado aposentados e suas famílias em situação delicada. A ex-diarista Maria do Socorro Silva Santana, de 80 anos, moradora da cidade de São Paulo, recebia o
Benefício de Prestação Continuada (BPC) há 15 anos, mas agora teve seu benefício cancelado.
Em 2019 ela recebeu uma carta do INSS informando que deveria se registrar no Cadastro Único. As informações registradas incluíam sua filha, que mora junto com ela e esse foi o motivo de seu benefício ter sido cortado.
“No ano passado recebemos essa carta e fizemos tudo direitinho. Agora o INSS alega que por ela morar comigo, eu tenho renda para sustentar a família, nas não é verdade. Mandei os documentos provando que minha renda é insuficiente, inclusive com comprovantes das despesas, do aluguel, das contas”, diz Gisele Santana, atendente de Recursos Humanos, filha da aposentada.
Ela conta ainda que, na carta, veio o susto pior. “Além de cancelar o benefício, eles dizem que temos que pagar R$ 53 mil reais para ressarcir os benefícios indevidos. Não temos de onde tirar esse dinheiro”, ela diz.
Gisele entrou com um pedido para que o benefício voltasse a ser pago, mas quando consulta o sistema do INSS, o que sempre aparece é a mensagem ‘em análise’.
A filha da idosa afirma que vai procurar assistência jurídica para poder reverter o caso.
Fonte: CUT Brasil | Escrito por: Andre Accarini | Edição: Marize Muniz | Arte: Alex Capuano-CUT
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